6 de julho de 2006

Super marcado #1

Os cépticos não acreditam na sua existência. Os crentes também não, embalados pela mitificação contínua que os transporta para outra dimensão, a dos sonhos. É preciso estar atento para notar que eles estão no meio de nós, discretos e vigilantes.
Foi há três semanas que, pela primeira vez, me cruzei com Super-Heróis. Não um, mas dois.
Acabara de tomar o pequeno-almoço no café do Senhor José, um desses espaços antigos reconvertido em sala de espelhos e cromados de acordo com o gosto modernaço. O café e o cigarro faziam das suas no meu tracto digestivo, e com discrição soltei uma bafo silencioso, a bem dizer uma bufa. Reparo então que, na outra ponta do balcão, um cliente esboça um sorriso matreiro e lança olhares furtivos na minha direcção. Penso, com embaraço súbito, que a sonoridade inexistente da exalação não o poderia ter alertado, muito menos o odor que, existindo, não tivera tempo de se propagar naquela distância. «Parece que o divirto, cavalheiro», disparo com alguma rispidez visando o sujeito. «Ora, ora, não se amofine», retorquiu ele com singular arcaísmo, «sorrir da libertação de gases não é infantilidade minha, é maldição». Caramba, pensei, é mesmo verdade, existe visão de Raio-Traque.

(continua)